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segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Egito Gonçalves

 

Egito Goncalves

Nome: José Egito de Oliveira Gonçalves

Nascimento: 8-4-1922, Matosinhos

Morte: 29-1-2001, Porto

Exerceu várias actividades profissionais, desde funções comerciais, a tradutor e jornalista. Figura reconhecida nos meios poéticos da década de 50, Egito Gonçalves esteve ligado a publicações onde se revelaram e afirmaram alguns dos maiores poetas da época contemporânea: fundou e dirigiu, no Porto, A Serpente ; participou na direcção do último número da revista Árvore ; foi co-director e um dos principais responsáveis de Notícias do Bloqueio ; dinamizador da colecção "Germinal"; um dos fundadores do Teatro Experimental do Porto; correspondente em Portugal do "Centre International d'Études Poétiques". Conhecida pelo seu cunho combativo e intencionalidade social, a poesia de Egito Gonçalves encontra muitas vezes no diálogo e apelo a um interlocutor não nomeado a situação comunicativa privilegiada para aludir de forma irónica ou diferida a contextos históricos, encontrando nessa mediação o distanciamento preciso para que a sua voz não ceda à expressão sentimental de um lirismo motivado por situações trágicas. Esse discurso dirigido a um tu, mensageiro do bloqueio e da resistência ("Vai pois e noticia com um archote / aos que encontrares de fora das muralhas / o mundo em que nos vemos, poesia / massacrada e medos à ilharga" ("Notícias do Bloqueio" in A Viagem com o teu Rosto ), ou companheira cujos "ombros nus são a evasão possível" ("Localização", in A Evasão Possível ), evolui também, sem rejeitar uma imagética de teor surrealista, para o discurso de um nós, que conhece uma situação colectiva de mordaça e paz absurda ("Morremos pouco a pouco neste vácuo / que a solidão nos serve como leito", in Os Arquivos do Silêncio ), mas que não recua, esperando o momento em que lhe será restituída a dignidade: "Este cemitério é vasto e sem muros. / Aí nos situamos; e entre nós / há esta só diferença: nós podemos / fazer ainda a vida acontecer." ("Colóquio com um Fuzilado", in Os Arquivos do Silêncio ).

Bibliografia: Poema para os Companheiros da Ilha, Porto, 1950; Um Homem na Neblina, Porto, 1950; A Evasão Possível, Porto, 1952; O Vagabundo Decepado, Porto, 1957; A Viagem com o Teu Rosto, Lisboa, 1958; Memória de Setembro, Porto, 1959; Diário Obsessivo, 1962; Os Arquivos do Silêncio, 1963; O Fósforo na Palha, 1970; O Amor Desagua em Delta (inclui A Evasão Possível, 1952; O Vagabundo Decepado, 1957; A Viagem com o Teu Rosto, 1958; Memória de Setembro, 1959), Porto, 1971; Luz Vegetal, Porto, 1975; Poemas Políticos (1952-1979), Lisboa, 1980; Os Pássaros Mudam no Outono, Porto, 1981; Falo da Vertigem, Porto, 1983; Dedikatória, Porto, 1989

Fonte: Infopédia

POEMA

NOTÍCIAS DO BLOQUEIO


Aproveito a tua neutralidade,
o teu rosto oval, a tua beleza clara,
para enviar notícias do bloqueio
aos que no continente esperam ansiosos.

Tu lhes dirás do coração o que sofremos
nos dias que embranquecem os cabelos …
Tu lhes dirás a comoção e as palavras
que prendemos – contrabando – aos teus cabelos.

Tu lhes dirás o nosso ódio construído,
sustentando a defesa à nossa volta
- único acolchoado para a noite
florescida de fome e de tristezas.

Tua neutralidade passará
por sobre a barreira alfandegária
e a tua mala levará fotografias,
um mapa, duas cartas, uma lágrima …

Dirás como trabalhamos em silêncio,
como comemos silêncio, bebemos
silêncio, nadamos e morremos
feridos de silêncio duro e violento.

Vai pois e noticia com um archote
aos que encontrares de fora das muralhas
o mundo em que nos vemos, poesia
massacrada e medos à ilharga.

Vai pois e conta nos jornais diários
ou escreve com ácido nas paredes
o que viste, o que sabes, o que eu disse
entre dois bombardeamentos já esperados.

Mas diz-lhes que se mantém indevassável
o segredo das torres que nos erguem,
e suspensa delas uma flor em lume
grita o seu nome incandescente e puro.

Diz-lhes que se resiste na cidade
desfigurada por feridas de granadas
e, enquanto a água e os víveres escasseiam,
aumenta a raiva
                         e a esperança reproduz-se.

Mais Poemas em: Jornal Poesia

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